segunda-feira, 5 de março de 2018

Eu quero é mais!

Quantos livros de autoras negras você já leu? Eu, mulher negra, confesso que só li quatro até agora. Mas foram quatro livros grandes, no sentido de grandiosos.

Li Quarto de despejo, de Carolina Maria de Jesus, que me rendeu um poema, e foi a primeira vez que recitei: ...mulher preta, favelada, reexiste, resistente. Carolina de Jesus? Presente!. Nesse dia, falei sobre Carolina, e foi como se eu conhecesse ela de longa data, cento e três anos de vida. 

Li Geni Guimarães e tive uma conexão com a construção identitária e toda crise que transborda na infância negra.

Foto: Renaud Hoyois
https://www.flickr.com/photos/russell-tribunal-on-palestine/
Li Angela Davis, leitura que me trouxe uma reflexão para além do que é estrutura. Pra mim, ela destrinchou o ser mulher, negra, lésbica e periférica -- onde estou no contexto social. Davis me ajudou a entender que mexendo na base -- onde estou -- mexe-se na estrutura inteira; como um edifício, se a base sede tudo vai a baixo.


Editora Malê
Sempre que me perguntam sobre as palavras e a escrita, eu digo que a palavra tem poder e a escrita transcende. Um bom exemplo disso é o livro Olhos de azeviche -- um presente antecipado de natal que ganhei em 2017 --, que reúne contos e crônicas de dez escritoras negras, sendo esse o quarto, e não último, dos livros dessa minha lista de iniciante. Esse valeu por muitos, porque todas essas escritas, ou melhor, "escrevivências", presentes nesse livro, têm algo em comum, que é o fato de terem me pegado pelo braço e me feito sentir cheiros, energias, sensações que me colocaram em estado de transcendência. 

Quando eu acesso a escrita de mulheres negras, sabendo que o ponto de partida em comum é gênero e raça, sei que um tanto daquilo que me é subjetivo vai se desdobrar em linhas e páginas. Sei que um tanto das minhas vivências aparecerão, a visceralidade vista a olho nu... É como se EU estivesse nua e as palavras dessas mulheres cobrissem meu corpo me protegendo do frio. Por isso eu quero mais, quero me despir e vestir essas palavras que cabem tão bem em mim. Eu quero mais é que as bibliotecas se transformem em um lugar quentinho para mulheres negras e suas escrevivências. Eu quero é mais!



Por Tainá Almeida

Preta, sapatão, soterosuburbana, Cronista do Rolé (na Bahia é rolÉ, é , é, é).

9 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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  2. Como bibliotecária só tenho a agradecer por essa iniciativa linda e inspiradora! Obg e vida
    longa ao mulheres negras na biblioteca ❤

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  3. Oi Tainá.
    Vai fazer alguns anos que eu me conscientizei sobre o quão pouco eu lia mulheres negras e resolvi mudar isso. Comecei com Carolina Maria de Jesus. Passei por Angela Davis, Conceição Evaristo, Angie Thomas, Octavia Butler e tantas outras.
    O sentimento de identificação ou ver essas mulheres escrevendo sobre algo no que me enxergo é muito bom.
    Abraços.

    Blog Impressões de Maria

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    Respostas
    1. Representação importa, e se ver na escrita é fortalecedor, porquê a palavra é a coisa mais poderosa que há, ela salva. Acessar literatura negra feminina é complementar a alma, aos poucos estou fazendo essa caminhada.
      Abraços, preta!

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    2. Aos poucos estou buscando essas representações. Demorei muito até chegar aqui, que bom que cheguei, aliás, que bom que chegamos! Tamu juntas, preta.
      Abraços

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